O morango destaca-se como uma fruta de grande relevância econômica e nutricional no Brasil. Sua produção é significativa em diversas regiões, especialmente no sul e sudeste do país, contribuindo para a geração de empregos e renda para pequenos e médios produtores . No entanto, o cultivo do morango enfrenta desafios constantes relacionados ao controle de plantas daninhas, que competem por recursos essenciais e podem reduzir a produtividade.
Para mitigar esses desafios, o uso de herbicidas tornou-se uma prática comum entre os agricultores. Esses produtos químicos auxiliam no controle eficaz das plantas indesejadas, promovendo um ambiente mais favorável para o desenvolvimento do morangueiro. Contudo, o uso inadequado de herbicidas pode acarretar sérios riscos, não apenas para a saúde humana, mas também para o meio ambiente e a sustentabilidade da própria lavoura.
Este artigo tem como objetivo explorar, de maneira aprofundada, os diversos riscos associados ao uso incorreto de herbicidas no cultivo de morango. Serão abordados os impactos na saúde humana, os efeitos ambientais, o desenvolvimento de resistência em plantas daninhas e as melhores práticas para um manejo seguro e sustentável.
O Papel dos Herbicidas no Cultivo de Morango
No manejo agrícola do morango, os herbicidas desempenham um papel crucial no controle de plantas daninhas. Essas plantas competem diretamente com o morangueiro por nutrientes, água, luz e espaço, podendo comprometer significativamente a qualidade e a quantidade da produção.
Tipos de Herbicidas Utilizados
Os herbicidas podem ser classificados, principalmente, em dois tipos:
Herbicidas Seletivos: Projetados para eliminar espécies específicas de plantas daninhas, preservando as culturas desejadas. No caso do morango, são utilizados para controlar ervas que competem diretamente com a planta sem causar-lhe danos.
Herbicidas Não Seletivos: Eliminam uma ampla gama de plantas, incluindo as culturas. São geralmente aplicados em áreas onde se deseja uma limpeza total da vegetação, como na preparação do solo antes do plantio.
Métodos de Aplicação
A eficácia dos herbicidas depende não apenas da escolha do produto adequado, mas também do método de aplicação correto. Os principais métodos incluem:
Aplicação Pré-Emergente: O herbicida é aplicado antes da germinação das plantas daninhas, criando uma barreira química que impede seu desenvolvimento.
Aplicação Pós-Emergente: O produto é aplicado diretamente sobre as plantas daninhas já emergidas, visando sua eliminação.
Aplicação Dirigida: Foca-se diretamente nas plantas daninhas, minimizando o contato com o morangueiro.
Benefícios do Uso Controlado
Quando utilizados de forma correta e controlada, os herbicidas oferecem benefícios significativos, tais como:
Aumento da Produtividade: Ao reduzir a competição por recursos, o morangueiro pode se desenvolver plenamente, resultando em maiores rendimentos.
Eficiência Operacional: Diminui a necessidade de capinas manuais ou mecânicas, reduzindo custos com mão de obra e tempo.
Melhoria na Qualidade dos Frutos: Um ambiente livre de plantas daninhas contribui para frutos de melhor qualidade, atendendo às exigências do mercado consumidor.
No entanto, é imperativo que o uso de herbicidas seja realizado com rigor técnico, seguindo as recomendações de dosagem, época de aplicação e medidas de segurança, para evitar os riscos associados ao uso inadequado.
Riscos para a Saúde Humana
O uso inadequado de herbicidas no cultivo de morango pode representar sérios riscos à saúde humana, afetando tanto os consumidores quanto os trabalhadores rurais envolvidos na produção.
Contaminação dos Frutos e Efeitos na Ingestão pelo Consumidor
A aplicação incorreta de herbicidas pode resultar na presença de resíduos químicos nos frutos de morango. Estudos indicam que, em algumas regiões produtoras, os morangos apresentam níveis elevados de resíduos de pesticidas, incluindo herbicidas, o que representa uma preocupação significativa para a saúde pública. A ingestão desses resíduos pode estar associada a diversos problemas de saúde, como distúrbios hormonais, efeitos neurotóxicos e até mesmo aumento do risco de câncer .
Impacto na Saúde dos Trabalhadores Rurais
Os trabalhadores rurais estão na linha de frente da exposição aos herbicidas. A manipulação inadequada desses produtos, sem o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) apropriados, pode levar à absorção cutânea, inalação ou ingestão acidental de substâncias tóxicas. As consequências para a saúde incluem intoxicações agudas, caracterizadas por sintomas como náuseas, tonturas, irritações cutâneas e respiratórias, e efeitos crônicos, como distúrbios neurológicos, problemas reprodutivos e câncer .
Estudos sobre Efeitos na Saúde
Pesquisas científicas têm demonstrado a relação entre a exposição a herbicidas e diversos problemas de saúde. Por exemplo, estudos apontam que a exposição crônica a certos agrotóxicos está associada a alterações endócrinas, imunológicas e neurológicas . Além disso, há evidências de que a exposição ocupacional a herbicidas pode aumentar o risco de desenvolvimento de certos tipos de câncer entre os trabalhadores agrícolas.

Regulamentações e Limites Máximos de Resíduos
Para proteger a saúde pública, órgãos reguladores estabelecem Limites Máximos de Resíduos (LMRs) de agrotóxicos permitidos em alimentos em diferentes países. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) é responsável pelo monitoramento desses resíduos nos alimentos por meio do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). De acordo com esse programa, resíduos de herbicidas que excedem os limites estabelecidos representam risco à saúde pública, podendo levar à proibição do uso de determinados produtos. No entanto, a fiscalização ainda enfrenta desafios, e o uso inadequado de herbicidas continua sendo uma preocupação relevante para consumidores e autoridades sanitárias.
Impactos Ambientais
O uso indiscriminado de herbicidas no cultivo de morango também traz sérios impactos ao meio ambiente. Esses produtos químicos podem afetar o solo, a água, a biodiversidade e até mesmo a qualidade do ar, comprometendo o equilíbrio ecológico da região produtora.
Contaminação do Solo
Herbicidas de uso contínuo podem se acumular no solo e alterar suas propriedades físico-químicas. Alguns produtos apresentam alta persistência, permanecendo ativos por longos períodos e prejudicando a fertilidade do solo. Além disso, essas substâncias podem eliminar microorganismos benéficos que desempenham um papel essencial na decomposição da matéria orgânica e na manutenção da saúde do solo.
A compactação do solo causada pela aplicação excessiva de herbicidas também pode dificultar a penetração da água e dos nutrientes, afetando negativamente o crescimento das plantas. Isso resulta na necessidade de maior uso de fertilizantes químicos, criando um ciclo prejudicial ao ecossistema agrícola.
Poluição da Água
A lixiviação e o escoamento superficial são dois mecanismos que contribuem para a contaminação da água por herbicidas. Durante períodos de chuva intensa ou irrigação excessiva, esses produtos podem ser levados para córregos, rios e lençóis freáticos, colocando em risco a qualidade da água utilizada para consumo humano e irrigação.
Alguns herbicidas possuem alta solubilidade e podem se acumular em fontes de água, afetando organismos aquáticos. Estudos indicam que a presença de resíduos de herbicidas na água pode impactar a reprodução de peixes e causar efeitos adversos na fauna aquática, como alterações hormonais e redução da biodiversidade.
Efeitos na Biodiversidade
A aplicação inadequada de herbicidas pode eliminar não apenas plantas invasoras, mas também espécies vegetais benéficas ao ecossistema agrícola. Isso pode afetar insetos polinizadores, como abelhas e borboletas, essenciais para a reprodução de diversas plantas, incluindo o próprio morangueiro.
Além disso, pequenos animais, como anfíbios e aves, podem ser intoxicados ao ingerir plantas ou insetos contaminados. Esse impacto na cadeia alimentar pode desestabilizar ecossistemas inteiros, reduzindo a diversidade biológica da região.
Persistência no Meio Ambiente
Alguns herbicidas possuem longa persistência no meio ambiente, permanecendo ativos por meses ou até anos após a aplicação. Isso pode levar à bioacumulação, ou seja, o acúmulo dessas substâncias em organismos vivos ao longo da cadeia alimentar, causando efeitos adversos mesmo em espécies que não foram diretamente expostas ao produto.
Resistência de Plantas Daninhas e Efeitos na Lavoura
O uso excessivo e repetitivo de herbicidas pode favorecer o surgimento de plantas daninhas resistentes. Esse fenômeno ocorre quando algumas ervas invasoras desenvolvem mecanismos naturais para sobreviver ao contato com o herbicida, tornando-se mais difíceis de eliminar.
Como a Resistência se Desenvolve?
A resistência acontece devido a mutações genéticas em algumas plantas daninhas, que lhes conferem tolerância ao herbicida aplicado. Com o tempo, essas plantas resistentes passam a se multiplicar, tornando-se dominantes na área cultivada. Isso obriga os agricultores a utilizarem doses cada vez maiores do produto ou recorrerem a novos herbicidas, aumentando os custos de produção e os impactos ambientais.
Efeitos na Produtividade da Lavoura
A proliferação de plantas daninhas resistentes reduz a eficácia do controle químico, dificultando o manejo da lavoura. Isso pode resultar em perda de produtividade, já que essas plantas continuam competindo com o morangueiro por recursos essenciais. Além disso, a necessidade de aplicação frequente de novos produtos pode comprometer a qualidade dos frutos e aumentar os riscos de resíduos nos alimentos.
Alternativas Sustentáveis ao Uso de Herbicidas
Diante dos riscos associados ao uso inadequado de herbicidas, é fundamental adotar práticas agrícolas mais sustentáveis para o manejo das plantas daninhas no cultivo de morango. Algumas alternativas incluem:
Métodos Mecânicos e Manuais
A capina manual e mecânica ainda são estratégias eficazes para o controle de ervas daninhas. Embora demandem mais mão de obra, essas práticas evitam a contaminação ambiental e garantem maior segurança alimentar.
Uso de Coberturas Vegetais
Plantas de cobertura, como leguminosas e gramíneas, podem ser utilizadas entre as fileiras de morango para reduzir a incidência de ervas daninhas. Essas plantas competem naturalmente com as invasoras, reduzindo sua proliferação sem a necessidade de herbicidas.
Rotação e Consorciação de Culturas
A rotação de culturas impede o crescimento contínuo das mesmas espécies de ervas daninhas, dificultando seu estabelecimento e adaptação ao ambiente. Já a consorciação, que consiste no plantio de diferentes espécies no mesmo local, favorece o equilíbrio natural e reduz a dependência de produtos químicos.
Uso de Bioherbicidas
Os bioherbicidas são produtos naturais à base de extratos vegetais, bactérias ou fungos que possuem propriedades herbicidas. Essas substâncias podem ser uma alternativa viável para substituir os herbicidas químicos tradicionais, reduzindo os impactos ambientais e riscos à saúde humana.
Boas Práticas para o Uso Seguro de Herbicidas no Cultivo de Morango
Para minimizar os riscos do uso de herbicidas, é essencial seguir boas práticas agrícolas, tais como:
Escolha correta do produto: Utilizar apenas herbicidas registrados para o cultivo de morango e seguir as recomendações técnicas.
Uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs): Trabalhadores devem utilizar luvas, máscaras, óculos de proteção e roupas adequadas durante a aplicação.
Respeito ao período de carência: Tempo necessário para a degradação do herbicida antes da colheita dos frutos, garantindo a segurança do consumidor.
Monitoramento e análise de resíduos: Testes laboratoriais podem verificar a presença de resíduos químicos nos frutos, assegurando que estejam dentro dos limites permitidos.
Capacitação de trabalhadores: Treinamentos sobre o manuseio correto dos produtos ajudam a reduzir erros e acidentes.

Conclusão
O uso inadequado de herbicidas no cultivo de morango representa sérios riscos à saúde humana, ao meio ambiente e à própria lavoura. Embora esses produtos sejam ferramentas importantes no manejo agrícola, é fundamental utilizá-los com responsabilidade e buscar alternativas sustentáveis para o controle de plantas daninhas.
A conscientização dos produtores sobre boas práticas agrícolas, o incentivo ao uso de métodos naturais e a fiscalização rigorosa dos resíduos nos alimentos são medidas essenciais para garantir um cultivo mais seguro e sustentável. Dessa forma, é possível equilibrar produtividade e preservação ambiental, assegurando um futuro mais saudável para produtores e consumidores.
Referências
EMBRAPA. Produção de Morangos no Brasil. Disponível em: https://ainfo.cnptia.embrapa.br
FIOCRUZ. Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos. Disponível em: https://visaemdebate.incqs.fiocruz.br
Governo do Paraná. Intoxicações por Agrotóxicos. Disponível em: https://www.saude.pr.gov.br
SciELO. Efeitos de Agrotóxicos na Saúde Humana. Disponível em: https://www.scielo.br